sexta-feira, janeiro 20, 2006

O velório...


" Uma parte importante da nação perdeu totalmente fé no parlamentarismo, e nas classes governamentais que o encarnam; e tende a substitui-la por outra coisa, que ela ainda não definiu bem a si própria."
Artigo de Eça de Queirós publicado anonimamente na «Revista de Portugal», publicação editada no Porto, mas que Eça dirigia desde Paris. Este artigo foi atribuído durante muito tempo a Oliveira Martins, mas Ernesto Guerra da Cal comprovou a existência do manuscrito original autógrafado.
Neste artigo, Eça afirma que, com a crise política provocada pelo Ultimato britânico de 1890, a população portuguesa passou a pensar que «antes qualquer outra coisa do que o que está». O problema era saber o que era esta «outra coisa». Um governo autoritário, com base no exército, parecia improvável. Então o que se perfilava no futuro parecia ser ou uma «revolução feita de cima, uma concentração de força na Coroa ... que não seria compreendida pela Nação», ou uma revolução vinda de baixo - a República, que para Eça «seria a confusão, a anarquia, a bancarrota.»
Acabava então perguntando, não apresentando naturalmente uma solução:
- «Que resta pois? Resta, como esperança, o sabermos que as nações têm a vida dura, e que o nosso Portugal tem a vida duríssima.» Sabendo que «entre nós têm-se visto governos que parecem absurdamente apostados em errar, errar de propósito, errar sempre, errar em tudo, errar por frio sistema.»
A história veio comprovar que Eça de Queirós para além de ser um grande escritor, assim como um grande jornalista, foi também um grande analista político. Este artigo previu os 40 anos seguintes. O reforço do poder real, com a «ditadura» de João Franco, apoiada por D. Carlos; a revolução republicana, que se tornou a anarquia que o autor previu, e a solução militar que era a menos previsível em 1890, mas que foi a que se mostrou a mais duradoira existindo durante 50 anos, de 1926 a 1976.
Janeiro de 2006, trinta anos depois ... o maior exemplo do empobrecimento moral e ético do país está na administração pública corrupta, nas milhares de baixas fraudulentas, nas vigarices dos subsídios de emprego e desemprego, nas falências habilidosas, nas fugas ao fisco e à segurança social, nos subsídios e outras honrarias. Em poucos anos viramos na "Portolíndia" ou "Portolândia". Por vezes, dou-me no meio de um qualquer estado sul-americano.
Aqui ou acolá, dos simples funcionários aos porteiros, dos motoristas à gente da limpeza, dos chefes de serviços, aos assessores, directores gerais, sub-secretários e secretários, aos ministros e outros "istros", a pequena e a grande corrupção, o clientelismo e o favor dominam a administração central e local, sufocando todos aqueles que por tolice ou teimosia embarcam no cumprimento escrupuloso de um verdadeiro serviço público, única via para o sucesso do país.
O Estado está minado e não tem cura.
Afinal o Eça já pensava nisto...
Então!?
Funeral, pela certa.
Venha a 3ª República. Este estado já morreu.
Às três, tem vez...( já dizia o Zé Pagode)
Paz à sua alma...

Sem comentários: