terça-feira, outubro 25, 2005

Ataques Agridem a Escola Pública

A propósito de “Ataques ignorantes agridem a escola pública” (A Página, Julho 2005, p. 2)

Será que a autora, Ana Benavente, é a mesma que esteve no Governo de António Guterres? Noutro artigo publicado n’ A Página, uns 2 anos atrás, assinou como “professora deputada” (como conciliaria a actividade de deputada com a de professora?), e agora assina como “investigadora. Universidade de Lisboa”.
Se é a mesma personagem, é admirável o texto ser escrito quando é um novo Governo PS, mais directamente o ministério da Educação, a atirar achas para exacerbar os “constantes ataques (…) à escola e a quem dela se ocupa”. Tal como o 1º Governo de Guterres (onde esteve Ana Benavente), este não tem peias em alterar unilateralmente o Estatuto da Carreira Docente em Julho e Agosto – mas, desta vez, armado com a maioria absoluta, a “espada justiceira” contra o défice decorrente dos “excessivos gastos com o funcionalismo público” e, para o que aqui diz respeito, contra “quem dela [escola] se ocupa”. Com a orquestra ministerial a tocar, com o apoio de muitos jornais, do Miguel Sousa Tavares e do Belmiro de Azevedo.
Terá Ana Benavente devolvido o cartão de militante do PS, como fez o colega António José Paixão, que assina, na mesma Página, p. 44, o artigo “PS-uma mão cheia de nada, outra de coisa nenhuma”?
Que diferenças foram estabelecidas nos anos de Governo Guterres? Os “objectivos mínimos” mudaram para “competências essenciais”, eis o sumo final remetido a uma masturbação de palavras. Permanecem escolas pobres, de mesas uniformizadas e iluminação de má qualidade (a ergonomia só é estudada no estágio dos professores), de arquitectura quadrada e homogeneizada. A “escola” dos alunos, com a ausência ou anuência dos pais – basta ler as estatísticas sobre o apoio parental em Portugal – remete-se em demasia ao menino Tonecas, às big nulidades propagandeadas pelas TVs, aos deuses da bola, aos fugazes gadgets que os pais compram (se puderem) para as crianças se sentirem enquadradas e socializadas. Mas estas “interferências” não se encontram na escola da Ana Benavente; nessa escola, os professores “não aturam canalha”. É tudo escola segura.
Falta também educação, mais do que “competências”, para que uma aula não desfaça a paciência do professor, não se torne andar no fio da navalha, com as provocações e desinteresse de alguns alunos, e de outros a bater palmas.
Refere a autora que a “escola (…) precisa de integrar novas linguagens (novas tecnologias)”. E as “velhas tecnologias”, já não têm sumo? Foram vividas e fizeram o seu papel? Ou será que a chegada dos míticos computadores serviu apenas para eliminar os gastos com ferramentas e materiais – papel, madeira, têxtil, barro – correntes (tradicionais) nas disciplinas de Expressões, e também diminuir estas na sua carga horária, número de docentes e importância para o desenvolvimento manual-técnico-artístico? O Teatro também é uma “velha tecnologia”, por oposição a qualquer “playstation” da moda? E, portanto, já não serve e há que a descartar (se é que algumas vez teve presente nas actividades lectivas).
Admirável é referir que “Os sindicatos, suicidários, não viram chegar as mudanças e vivem no passado”. Presumo que já fez o inventário das propostas dos sindicatos (todos) relativamente ao funcionamento escolar, cargas horárias, acções de formação, actas de congressos, publicações, etc., e concluiu que são “suicidários”. Mais um pouco, e estaria a rotular os sindicatos de “corporações de interesses”, e a elogiar a “coragem” de quem tem a faca na mão.
Talvez eu tenha lido mal o artigo, e pretenda este ser genérico, onde os únicos “de quem dela [escola] se ocupa” sejam “os professores e investigadores das ciências da educação”, em que os professores em causas não são aqueles que estão nas escolas básicas – que escrevem actas, discutem questões pedagógicas, fazem propostas, criam clubes, mas também se limitam às suas aulas e criticam em conversas de café – agora atarefados com os novos e desprestigiantes despachos vindos do ministério, mas antes os seus colegas do ensino superior, dedicados às ciências da educação.
Admiro-me também ler esta prosa num jornal que emana dum sindicato, “suicidário” segundo a autora. Porque é que não escreve no “Portugal Socialista” ou no “Jornal de Notícias”?

Franklin Pereira, professor, há 18 anos a aturar a demagogia da 5 de Outubro.

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